Jorge Campos
Santa Catarina e a Flórida diante as tensões comerciais entre Brasil e Estados Unidos
Indústria catarinense sente efeitos da queda nas exportações para os EUA enquanto programas de inovação e diplomacia econômica avançam
Santa Catarina, a Flórida e o novo tabuleiro geoeconômico entre Brasil e Estados Unidos
A relação entre Santa Catarina e os Estados Unidos, com ênfase na Flórida, vive uma fase de reconfiguração que ultrapassa o campo estatístico e passa a exigir leitura estratégica. O ambiente internacional mudou de forma significativa, já que os Estados Unidos reforçaram investigações tarifárias sobre diversos parceiros e o Brasil ajusta suas estratégias de inserção externa. As cadeias logísticas, por sua vez, acumulam novos pontos de pressão e de oportunidade. Santa Catarina ocupa um papel singular nesse processo, uma vez que combina peso industrial, capacidade exportadora e vocação para inovação.
As fontes oficiais norte-americanas ajudam a evidenciar essa interdependência. O Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) informa que, em 2024, as exportações da Flórida para o Brasil atingiram 6,1 bilhões de dólares. No mesmo período, o comércio total de bens entre Estados Unidos e Brasil somou 91,5 bilhões de dólares. O volume demonstra um relacionamento de escala continental no qual Santa Catarina se insere como fornecedor de setores específicos, incluindo proteína animal, tecnologia embarcada, máquinas, componentes automotivos e bens industriais de alta precisão.
A Flórida reconhece formalmente essa relação. O Brasil foi o principal destino das exportações da Flórida em 2022. No total, o fluxo bilateral de mercadorias entre Flórida e Brasil somou 22,6 bilhões de dólares. Parte significativa dessa movimentação envolve produtos fabricados nas regiões industriais de Joinville, Blumenau, Itajaí, Jaraguá do Sul e Chapecó. Isso confirma que o corredor Santa Catarina e Flórida não é apenas um fluxo comercial, mas também uma via de intermediação tecnológica, logística e empresarial.
No entanto, o ambiente atual apresenta riscos. Relatórios recentes do Congressional Research Service (CRS) destacam que programas investigativos, como a Section 301, podem elevar tarifas sobre importações norte-americanas. Esse efeito atinge setores nos quais Santa Catarina é altamente presente. As áreas impactadas incluem agroindústria, polímeros, partes industriais e alimentos processados. Em suma, discussões regulatórias em Washington repercutem com peso direto sobre a competitividade catarinense.
A realidade prática ilustra esse ponto. Empresas de Santa Catarina relatam dificuldades logísticas e retenção de cargas em função de tarifas aplicadas pelos Estados Unidos sobre sucos, carnes e derivados. O caso mais recente envolveu a paralisação de mais de dois mil toneladas de suco produzido no estado após ajustes tarifários. O episódio confirma que a dependência do mercado norte-americano exige previsibilidade regulatória e atenção permanente a mudanças de política comercial.
Esse quadro, entretanto, não se resume a desafios. A Flórida possui infraestrutura portuária e aeroportuária preparada para atuar como porta de entrada de produtos sul-americanos em território norte-americano. Essa condição abre espaço para que Santa Catarina amplie seu papel em cadeias globais de suprimentos, especialmente nos setores de energia limpa, manufatura avançada, logística integrada e tecnologia aplicada a operações internacionais. A coordenação entre governo estadual, federações empresariais e câmaras binacionais sediadas na Flórida torna-se elemento central desse avanço.
Para Santa Catarina, o objetivo estratégico passa por consolidar sua posição no corredor econômico Brasil e Flórida não apenas como exportador, mas como articulador de cadeias globais. Para a Flórida, o estado catarinense representa uma fonte consistente de produtos de alto valor agregado e um parceiro industrial confiável. A convergência entre esses interesses depende de diplomacia econômica, inteligência de mercado e capacidade de adaptação às mudanças que o cenário internacional impõe.
1. Exportações de SC e queda para os EUA
A FIESC divulgou em 6 de novembro que as exportações catarinenses cresceram 5,2% em outubro e atingiram 1,1 bilhão de dólares, mas ressaltou uma queda de 20,8% nas vendas para os Estados Unidos, o que confirma o impacto direto do mercado norte-americano sobre a indústria de Santa Catarina e reforça a necessidade de monitoramento permanente das condições comerciais entre o estado e a Flórida.
2. Pressão sobre setores industriais
O levantamento de outubro também identificou que segmentos catarinenses como motores elétricos, cerâmica, proteína animal e componentes eletromecânicos foram os mais afetados pela redução das compras norte-americanas, uma vez que esses setores dependem de maneira intensa do corredor logístico que conecta os portos de SC à Flórida, especialmente Miami e Jacksonville.
3. Internacionalização acelerada
A ACATE reforçou nas últimas semanas que o programa Global Gateway entrou em nova fase com foco ampliado nos Estados Unidos, o que inclui mentorias e conexões diretas com hubs como Miami e Orlando; segundo a entidade, empresas catarinenses de software, automação, saúde digital e indústria 4.0 estão entre as que mais avançaram em negociações com parceiros norte-americanos.
4. Diplomacia econômica ativa
A Secretaria de Estado da Fazenda, em comunicados oficiais de novembro, destacou que Santa Catarina intensificou sua agenda de diplomacia econômica com foco nos Estados Unidos, priorizando estabilidade logística e previsibilidade regulatória; o governo catarinense mencionou conversas com federações empresariais e câmaras binacionais para mitigar riscos tributários e consolidar oportunidades no mercado da Flórida.



COMENTÁRIOS